O Ministério Público Federal (MPF) apresentou uma denúncia contra a vereadora de João Pessoa (PB), Eliza Virgínia (PP), acusando-a de incitação ao ódio e discriminação contra a comunidade LGBTQIA+. A ação judicial, aceita pela Justiça no final de fevereiro, baseia-se em seis publicações feitas pela parlamentar em suas redes sociais, que, segundo o MPF, violam a Lei do Racismo. O órgão pede a condenação da vereadora com a aplicação cumulativa das penas, além da definição de um valor mínimo para reparação dos danos causados à coletividade LGBTQIA+. Caso seja condenada, Eliza Virgínia pode enfrentar uma pena de 12 a 30 anos de prisão, já que cada ocorrência pode resultar em uma sentença de 2 a 5 anos de reclusão, somadas devido às múltiplas postagens identificadas.
As publicações que deram origem à ação penal ocorreram entre 2021 e 2023, abordando temas como políticas públicas, identidade de gênero e a participação da comunidade LGBTQIA+ na sociedade. O MPF argumenta que as declarações da vereadora ultrapassam os limites da liberdade de expressão, configurando-se como incitação ao ódio e discriminação.
Entre as postagens denunciadas, destaca-se uma de outubro de 2021, em que a vereadora criticou o Programa de Dignidade Menstrual do Estado da Paraíba, manifestando repúdio ao fato de a iniciativa incluir homens transgênero. O MPF apontou que a parlamentar ignorou a realidade biológica desses indivíduos e utilizou o tema para disseminar desinformação e preconceito. Além disso, ela afirmou, de forma equivocada, que mulheres trans estariam entre as beneficiárias do programa, o que foi interpretado pelo MPF como uma tentativa de descredibilizar políticas públicas inclusivas.
Em janeiro de 2023, a vereadora publicou vídeos no Instagram e TikTok nos quais se referiu à transgeneridade na infância como uma “anormalidade” e uma “epidemia” influenciada pela mídia e pelas famílias. O MPF considerou que essas declarações deslegitimam a identidade trans e incentivam o preconceito. Em outro vídeo, publicado em fevereiro do mesmo ano, ela abordou a participação de mulheres trans no esporte, alegando que a “ideologia de gênero” priorizaria “homens primeiro, mulheres e crianças depois”. Para o MPF, essa fala desrespeita a identidade de mulheres trans e promove o ódio contra a comunidade LGBTQIA+.
Em março de 2023, a parlamentar compartilhou imagens de crianças em eventos LGBTQIAP+ e de drag queens segurando bebês, sugerindo uma conexão entre a comunidade e a violação de direitos infantis. O MPF argumentou que essa associação busca estigmatizar e demonizar o grupo, reforçando estereótipos negativos. Já em junho de 2023, a vereadora se referiu à existência de crianças trans como um “show de horror” e classificou a identidade de gênero como algo “vil e imoral”. O MPF entendeu que essas declarações reforçam um discurso de intolerância e exclusão.
Ainda em junho de 2023, Eliza Virgínia publicou uma entrevista na qual discutia um projeto de lei que proíbe a participação infantil em eventos de cunho erótico. Durante a entrevista, ela citou a “parada gay” como exemplo, associando-a a uma visão estigmatizada da comunidade LGBTQIA+. Para o MPF, essa fala reforça estereótipos negativos e contribui para a discriminação.
O MPF fundamentou a denúncia no Artigo 20, § 2º, da Lei do Racismo, que tipifica o crime de incitação ao ódio e discriminação. Como as postagens ocorreram em momentos distintos, o órgão entende que há um concurso material de crimes, permitindo a soma das penas conforme previsto no Artigo 69 do Código Penal. Além disso, a denúncia cita o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que equiparou a homofobia e a transfobia ao crime de racismo. O STF já firmou entendimento de que a liberdade de expressão não protege discursos de ódio que promovem intolerância e violência contra minorias, e que crimes de racismo não admitem acordos de não persecução.